Terrenos de Marinha são os bens imóveis localizados a até 33 metros em direção ao continente, contados a partir da medida média das marés altas e baixas do ano de 1831, chamada linha de preamar médio (LPM).
Todos os imóveis situados até a linha-limite de terreno de marinha, são de propriedade da União.
Também pertencem à União os aterros, denominados acrescidos de marinha, e as margens de rios e lagoas que sofrem influência das marés.
Regimes de Uso
Quanto ao uso em terrenos de marinha, são dois os regimes vigentes: Regime de ocupação e Regime de aforamento.
No Regime de Ocupação, a União tem 100% do imóvel, mas um terceiro o ocupa. O particular possui um título precário, que, portanto, é resolúvel a qualquer tempo.
Esse título não gera ao ocupante qualquer direito sobre o terreno, pois o domínio pleno é da União, que pode, a qualquer tempo, imitir-se na posse do imóvel, indenizando as benfeitorias feitas sobre o bem.
Dado esse caráter precário, é difícil ver instituições financeiras autorizando quaisquer créditos imobiliários para a aquisição do direito de ocupação, porque não há uma garantia real que assegure o pagamento do recurso obtido.
Nesse regime a União exige o pagamento da taxa de ocupação de 2% do valor do imóvel, excluídas as benfeitorias.
Já no Aforamento, o proprietário tem 83% do imóvel e a União tem 17%.
Trata-se de um direito real, decorrente de contrato, no qual a União atribui a terceiros o domínio útil (83%) de um imóvel de sua propriedade, mantendo o domínio direto (17%).
Nesse regime, a União cobra o foro anual de 0,6% do valor do domínio pleno do terreno.
Cadastro x Registro de Imóveis
Os bens pertencentes à União se encontram cadastrados junto à sua Secretaria de Patrimônio.
E, segundo a SPU, cerca de quinhentos mil imóveis se encontram localizados em terrenos de marinha.
É importante ressaltar que, em se tratando de imóveis pertencentes à União, as informações cadastrais preponderam sobre quaisquer outras, inclusive as contidas no registro de imóveis.
Assim, se o imóvel se localiza em terreno de marinha, ainda que tenha uma matrícula individualizada, isso não torna o detentor proprietário do bem, salvo se o tiver adquirido, em sua totalidade, da União.
No que tange ao Registro de Imóveis, as situações são as mais anômalas possíveis: há imóveis registrados, outros ainda com transcrição e alguns sequer registrados.
Desta forma, o interessado pode ter uma matrícula individualizada do bem, ser uma das averbações em uma transcrição, ou mesmo não ter qualquer documento que respalde sua utilização do bem público.
É fundamental, portanto, constatar qual a real situação do bem, perante a União e perante o registro imobiliário, e promover qualquer regularização que seja necessária.
Regularização
Mas o que significa exatamente regularizar o imóvel localizado no terreno de marinha?
Bem, essa regularização que deve contar com a devida orientação e acompanhamento profissional, consiste em tomar as providências visando tornar o mais próximo possível a situação cadastral/registral da realidade de fato.
Isso vai conferir ao interessado a possibilidade de usufruir de qualquer benefício que seja concedido, ou a titularidade para propor as medidas em defesa de seus direitos, que eventualmente sejam necessárias.
Além disso, e dependendo das circunstâncias, é possível buscar uma alteração de regime, de maneira que a mera ocupação se torne aforamento, desde que atendidos os requisitos legais específicos, inclusive de forma não onerosa (gratuita), que amplia consideravelmente o direito do interessado sobre o bem, eleva muito seu valor de mercado, além de reduzir o percentual da taxa anual.
Deste modo, está claro que a regularização da situação só traz benefícios ao proprietário do imóvel localizado na área de terrenos de marinha.
E agora.... a PEC!
Um ponto que merece especial atenção de quem detém imóvel em terreno de marinha é a Proposta de Emenda Constitucional 39/11, atualmente tramitando no Senado Federal sob o nº 3/2022, que prevê a alteração da relação entre União e ocupantes/foreiros, quanto a esses bens, que poderão passar a ter o domínio pleno do imóvel.
Embora em princípio pareça uma boa notícia, não está claro, ainda, a repercussão que isso poderá ter na vida patrimonial dos ocupantes e foreiros.
De começo, a necessidade de regularização perante a SPU fica clara na redação dos incisos III e IV, do art. 1º, da PEC:
Art. 1º As áreas definidas como terrenos de marinha e seus acrescidos passam a ter sua propriedade assim estabelecida:
.........
III – passam ao domínio pleno dos foreiros e dos ocupantes regularmente inscritos no órgão de gestão do patrimônio da União até a data de publicação desta Emenda Constitucional;
IV – passam ao domínio dos ocupantes não inscritos, desde que a ocupação tenha ocorrido pelo menos 5 (cinco) anos antes da data de publicação desta Emenda Constitucional e seja formalmente comprovada a boa-fé
Ou seja, ocupantes não cadastrados terão de comprovar não só a ocupação, com exigência de prazo de detenção do bem, mas também a boa-fé.
E, quando a PEC trata de como se dará a transferência do domínio aos ocupantes e foreiros, o cenário fica mais complicado ainda.
De fato, os milhares de imóveis que se encontram nessa faixa litorânea conferem uma renda para a União de cerca de R$ 500 milhões/ano, segundo dados da Secretaria do Patrimônio, não sendo de se esperar que o Estado renuncie a eles sem uma contraprestação.
E, no texto atual da PEC, ainda sujeito a alterações, está previsto que a União faça a transferência onerosa (mediante pagamento) aos ocupantes/foreiros (art. 1º, § 1º, II), no prazo de até 2 anos (art. 3º).
Isso equivale dizer que o ocupante ou foreiro, mesmo que tenha comprado o imóvel, terá de recomprá-lo, agora da União.
No que diz respeito aos foreiros, como já detém o domínio útil, teriam de pagar os 17%, pertencentes à união.
Mas, e os que detém os bens a título de mera ocupação, que são a maioria? Em princípio, como a propriedade da União é plena, o pagamento teria de ser de 100% do valor do imóvel, descontadas as benfeitorias.
Neste cenário, parece prudente que o interessado, que seja ocupante, já busque assessoria profissional, a fim de verificar não só sua regularidade cadastral, mas também se existem benefícios legais nos quais possa se amparar, para melhorar a qualidade de seu título e seus direitos sobre o imóvel.
Mesmo porque, para os ocupantes e foreiros devidamente cadastrados perante a SPU, ainda haverá a possibilidade de um abatimento no preço, correspondente ao valor pago nos últimos 5 anos a título de foro ou taxa de ocupação, atualizado pela SELIC (art. 3º, parágrafo único, da PEC).
Como se vê, a questão dos terrenos de marinha ainda deve acarretar muitas e acaloradas discussões.
A única certeza que se pode ter é que, no momento, o mais prudente é buscar o máximo de regularização possível, tanto perante a Secretaria de Patrimônio, quanto perante o Registro de Imóveis, inclusive avaliando-se a possibilidade e condições de alteração de regime, caso seja mero ocupante.
Estar com o bem devidamente regularizado possibilitará ao detentor gozar de quaisquer benefícios que a legislação venha a oferecer, pleitear direitos, elevar o valor de mercado de seu bem, e, provavelmente, evitar muito problemas.
Aviso Legal: Este post foi criado para fornecer uma compreensão básica sobre o tema tratado, no contexto jurídico brasileiro. Para mais informações e assistência legal específica, é aconselhável consultar um advogado.
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